segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Pior do que está fica!


     Quando me meti nesta empreitada, ainda na Rússia, cabe dizer, confesso que fui movido pelo desespero e nada mais. A situação é cínica, como dizia o Adoniran. De quebra há um trocadilho ainda pior: tá ruço, mano. E está mesmo. Todas as previsões se mostraram pífias, e o tal do fenômeno Russomanno mostrou a língua a todos os analistas de jornais: não baixou, cresceu. E está aí na porta de nossas casas, nas esquinas, nas praças, na televisão, nos meus piores pesadelos.
         O Serra, creio, dispensa comentários. Espero que estes oito anos de administração falem por mim: todo o pouco que esta cidade tinha de bom, suas noites, seu despojamento cultural, sua vida fervilhante, seus tipos, suas ruas, tudo ameaça desaparecer em quatro anos de mandato. Se é que ainda não desapareceu, como o defunto que esqueceram de enterrar.
         Por essas e outras acabei me metendo em questões de campanha, na medida do possível, sem grandes sacrifícios já que a minha convicção não os permite. E digo, entre lágrimas, com decorado desespero: é 13, Fernando Haddad. O termo campanha, me parece, tem origens militares. Pois bem, entrei nessa história de campanha como um pracinha, um cabo, sei lá, daqueles que limpam a latrina e descascam batatas porque paciência, a vida aconteceu assim, e que um belo dia, ao tocar da corneta, se viu fardado lutando contra os alemães, na eminência da morte ou do fim dos pagamentos.
         Não morro de amores pelo PT, embora o admire, não pelas ideias mas pelo realismo, pelo balde de água fria que deu nas almas mais sensíveis, mostrando como é que se pode fazer política na atual conjuntura, sem rachar o país nem nos meter em crises de qualquer ordem. O meu lado mais lúcido encara tudo como paliativo, e os anos de lulismo assim não teriam trazido nada de novo, apenas uma atualização do progressismo de um Juscelino Kubitschek. Já o lado inocente ainda vê alguma luz, como, com Getúlio e Juscelino, vieram Goulart, Brizola e Arraes. Mas essa luz pode ser só mais outro farol de carro.
         Estamos a uma semana da eleição, e o cenário ainda é completamente incerto. Quer dizer, há a triste certeza da Patrulha do consumidor, a cidade na estupidez da ordem e na orgia do progresso. Nova lei de zoneamento, mais automóveis na rua, Nova Luz, ônibus a R$3,00, recordes de chacina pela polícia, educação e saúde nos estados mais ou menos calamitosos a que já nos acostumamos, quase como patrimônios culturais. E eu de minha parte não quero lavar as mãos, digitando, de qualquer forma, números confusos na minha seção eleitoral. Digo e repito: o que eu quero é me comprometer, sejam quais forem os riscos. No caso de Fernando Haddad, não vejo, com a devida lucidez dos cálculos, que sejam altos. É professor universitário, homem das esquerdas, e que bem ou mal trouxe propostas interessantes, como o bilhete único mensal e a descentralização dos polos de trabalho da cidade, colaborando (paliativamente! mas colaborando) para o fim do trânsito. Vindo depois do Kassab, certamente terá um prazer quase sádico em desfazer as burradas mais exemplares da última prefeitura, como o escandaloso caso da Controlar, a expulsão dos artistas das ruas, a caretificação da cidade em geral. Ao menos assim o espero, repito: ponho minha língua na mesa. Nada foi dito em relação ao surto imobiliário, e o receio de assustar o cidadão de bem pagador de impostos, o consumidor indefeso, é fonte de cautelas para abordar qualquer solução mais drástica.
         Se perguntarem do Maluf, respondo: o PP emplacou um ministério. O acordo já se cumpriu.
Quanto aos riscos de lavar as mãos com a pureza do “nulo”, numa verdadeira masturbação moral, são em parte conhecidos: José Serra terá também prazer imenso em continuar fazendo o que sempre fez. E mais: se sair, para o estado OU para a república, deixará no alto poleiro do edifício Matarazzo mais outro pessedista, que vai achar a cadeira quentinha e a carta branca pra passar seis anos no governo. O filme é velho e nem graça tem mais. Mas o filme novo pode ser de terror: espero que o hipotético leitor saiba alguma coisa sobre as propostas de Celso Russomanno, como as câmeras de vigilância ou o policiamento ostensivo. Mas também ele é autoexplicativo, tanto pela figura da Patrulha do consumidor, quanto pelo apoio de igrejas evangélicas ou pela tradição tão paulista de tipos como este, conservadores populistas. E desta vez não podemos nem mesmo ter o prazer de gritar “o jeito é Jânio”, ou ouvir o delicioso sotaque de “brimo” de Paulo Maluf. Repito: a piada e velha e já não tem mais graça. E os riscos são altos. Já não preciso lembrar que na atual conjuntura política paulista, dificilmente teríamos coisa melhor, como a Guanabara vem esboçando timidamente na figura brilhante de Marcelo Freixo.
E foram tantas as decepções com o PT... não, melhor não pensar, abdico por hora das minhas convicções. Até domingo, quando, mesário, acordarei às seis da manhã para ir à seção que foi-me por Deus e pelo Tribunal Eleitoral indicada, nesta última e desesperadora semana de campanha ponho a honra e os princípios de lado e compro a briga. Não há nada a perder. E depois de seis anos de Kassab, sob o risco de mais quatro de Russomanno ou Serra, vai ser necessário um esforço espetacular, sobre-humano, até, da parte de Fernando Haddad para afundar ainda mais esta cidade, tão boa, coitada, quanto estúpida. Se tudo der errado é porque no fundo merecemos.

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