terça-feira, 18 de dezembro de 2012

A mesa ao lado


Não se trata, de modo algum, de falar da vida alheia. Nem de especulação. Mas quantas vezes, sentados no canto de um bar, esperando um ônibus, na fila do banco, na biblioteca, em qualquer lugar em que não estamos sós, enfim, quantas vezes não nos chega quase por destino um rabo de conversa que no mesmo instante passa a integrar a nossa tarde e a nossa vida? E não porque seja uma novela, ou um barraco – que aliás também são ótimos de se ver –, mas mais por se tratar de um adendo indispensável à nossa própria existência, como a passagem que poderíamos ter vivido, gostaríamos de ter vivido, pelo menos para entender aquela outra pessoa que fala alto no telefone, o senhor baixo aflito com sua pasta de papéis, a criança morena fascinada com algum inseto: em suma, coisas simples que nos integram à humanidade, enquanto nos enfurnamos num livro, nos trancafiamos entre dois fones de ouvido ou simplesmente pensamos na morte da bezerra: o ônibus não vem? Vai chover amanhã? Será que ela vai responder?...
         E é bem nessas horas, por alguma ironia, que a vida na cidade acontece. Atentar para os detalhes, para as migalhas irrisórias de miséria ou de beleza que compõem os quadros mais banais da vida urbana: seria o trabalho ideal do cronista. O dia-a-dia é confuso, e só em alguma sociedade perfeita é que se poderia exigir de todos que atentassem para seus irmãos e irmãs no puro acaso. É preciso, mais do que nunca é preciso que alguém se disponha a coletar esse material disperso, quer num flagrante de esquina, quer nas palavras de uma criança: algo de seu conteúdo humano, que torna a vida mais digna de ser vivida, a cidade mais dócil de ser habitada.
         É nesse propósito que, ainda que temporalmente (ou seja, enquanto há tempo), oferecemos ao hipotético leitor deste pseudoperiódico este pequeno contributo, dessufoco  de algumas terças-feiras. E não é à toa: terça é aquele dia em que a semana se impõe – de segunda a semana ainda é vaga –, e a alma perturbada com tudo de prosaico que se compõe em pão, em banco ou em sono acaba procurando involuntariamente algum sentido neste correr de dias, nesta faina infindável e, não raro, vazia. Pois o pior é que é só terça: ainda faltam pelo menos três dias...
         Portanto, leitor hipotético, tome fôlego, pegue um ônibus, mas resista! Não ligue a música, não abra um livro, não se afobe: escute o que se passa a sua volta, qualquer que seja a cidade, a rua, ou a hora do dia. É um convite deste humilde cronista, que tanto já andou de ônibus, de metrô e de trem, que já filou cigarro em muitos pontos de ônibus, já pediu água da pia e já pediu informações, quase dormiu no relento, e que agora, que lhe sobra um tempo, acha digno compartilhar essas histórias, bem como o olhar que as entretece nestas linhas.

         Grato pela atenção
         Joaquim Terêncio

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